Niquelândia: crescimento sustentável

Com suporte econômico da iniciativa privada e apoio técnico da Interação Urbana, Niquelândia/GO começa a desenvolver seu Plano Diretor Participativo

 

Ao contrário do que se costuma ver no Brasil, onde é comum a expansão urbana desordenada, as cidades brasileiras – de qualquer porte – podem e devem se desenvolver de forma organizada. E a primeira condição para isso, basicamente, é adotar os princípios do planejamento na gestão pública.

No início de abril de 2019, o município de Niquelândia/GO iniciou oficialmente esse processo. Para isso, vem recebendo apoio de investimentos sociais privados (Instituto Votorantim) e assessoria técnica especializada da Interação Urbana.

“Toda cidade deveria ou poderia crescer de maneira ordenada e oferecer serviços de qualidade aos seus moradores. Esse deve ser o objetivo dos poderes representativos existentes no território (Executivo e Legislativo)”, avalia Mauro Zanin, especialista em gestão pública e diretor da Interação Urbana. Para ele, a necessidade de organização das cidades se torna cada vez mais evidente com o “êxodo rural, o crescimento populacional e a exploração de novos territórios, que provocam o avanço da urbanização”.

 

Plano Diretor (PD): fundamentos

O Plano Diretor visa orientar a atuação do poder público e da iniciativa privada na construção dos espaços urbano e rural e também na oferta dos serviços públicos essenciais. O seu processo de elaboração resulta em ordenamento do crescimento e das edificações, em legislação atualizada de regulação e controle e no estabelecimento de espaços de convivência urbana, com áreas verdes, lazer e oferta de serviços públicos.

A Interação Urbana aportou uma equipe de especialistas para apoiar tecnicamente o município de Niquelândia/GO em seu Plano Diretor Participativo. Os trabalhos são coordenados pelo arquiteto Mauro Ferreira, professor do Programa de Pós-graduação em Planejamento e Análise de Políticas Públicas da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da UNESP (Campus de Franca), e contam com a participação de Cynthia Montans, arquiteta especialista e responsável pela coleta de dados, elaboração das propostas e coordenação das reuniões técnicas e comunitárias, Ricardo Zerbinato, pós-graduado em gestão de cidades e responsável pela área administrativa do projeto, que inclui o processo participativo da população na elaboração do PD, e Marcelo Costa, coordenador dos estudos socioeconômicos e cartografia.

Segundo o professor Mauro Ferreira, as condições para implementação do PD, uma vez que este seja concluído, são de caráter normativo (novas leis complementares, decretos), de orientação às políticas públicas de uso e controle territorial e de intervenções (projetos e obras físicas). Sob o ponto de vista legal, além da Lei do Plano Diretor, são produtos do processo uma nova Lei do Perímetro Urbano e Expansão Urbana, Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano (Zoneamento) e Código de Posturas Municipais.

O plano diretor deve prever um horizonte de dez anos e, uma vez indicadas as ações necessárias, sua execução deve ser garantida pelo orçamento municipal ou outras vias de financiamento. “Os projetos poderão orientar a prefeitura a buscar recursos nas esferas federal e estadual, além de parcerias com a iniciativa privada”, observa Mauro Ferreira.

 

Desenvolvimento do PD

O processo de elaboração do PD dura aproximadamente oito meses e inclui diversas ações de campo. Começa com a coleta de dados na própria prefeitura e em pesquisas primárias e secundárias, que incluem entrevistas e visitas para reconhecimento do território e da realidade local. Também é feito o mapeamento de todo o município, por meio de imagens aéreas, mapas fornecidos pela prefeitura, IBGE e outras fontes. “O mapeamento é essencial para uma leitura mais detalhada do município, possibilitando estudos mais precisos visando melhores soluções urbanísticas”, explica Cynthia Montans.

Um aspecto importante é a participação da população. Ela ocorre em reuniões específicas com a comunidade, quando são levantadas questões que nem sempre estão diretamente ligadas ao planejamento urbano a médio e longo prazos. “Nosso trabalho é fazer uma seleção prévia das sugestões, opiniões, questões levantadas, transformá-las em diretrizes urbanísticas, e levar tudo ao Núcleo Gestor do projeto, a fim de verificar as possibilidades orçamentárias para cumpri-las”, acrescenta a arquiteta.

Para o professor Mauro Ferreira, a participação social é vital para o próprio futuro do PD. “Para que a legislação e os projetos previstos não sofram descontinuidade, é importante abrir espaços de participação da comunidade local e seu envolvimento direto na discussão e na elaboração do plano, de maneira que a comunidade se sinta responsável por ele, e não apenas os poderes constituídos.”

 

Niquelândia

O município goiano de Niquelândia, distante 330 km de Goiânia, tem cerca de 45 mil habitantes. A mineração é a principal atividade econômica, em especial a extração de níquel, mas também de ouro, cobre e cerca de 120 outros minérios. E o grupo Votorantim, nesse aspecto, é uma das principais organizações privadas atuantes na região. Mas a cidade também é um importante polo turístico do Estado, devido a eventos folclóricos e ao Lago de Serra da Mesa, e tem ainda uma diversificada agropecuária.

Nessas condições, o território recebe um grande fluxo migratório de pessoas em busca de oportunidades, o que impacta o número de habitantes, moradias, saneamento, energia e também o tráfego de veículos, entre outras variáveis urbanas. “A necessidade de organização do território é evidente”, diz Zanin. “E a Votorantim, por meio do Instituto Votorantim, está apoiando o município ao assumir o compromisso de monitorar, potenciar e mitigar esses impactos, dependendo de sua característica.”

Equipe IU faz nova rodada de encontros

A equipe de consultores da Interação Urbana (IU) esteve novamente em Niquelândia, de 24 a 28 de abril (2019), para assessorar o município na revisão de seu Plano Diretor – ação que faz parte do Programa de Apoio à Gestão Pública do Instituto Votorantim. Foram realizadas duas reuniões urbanas e cinco rurais nas regiões de Buriti Alto, Muquém, Rio Vermelho, Indaianópolis e Vila Taveira, todas em escolas municipais.

As atividades incluíram uma reunião específica com profissionais de engenharia, arquitetura e urbanismo municipal na sede da Associação Comercial e Industrial e uma reunião com o Sindicato Rural. No encontro com a comunidade, foram utilizadas dinâmicas de grupo para ouvir as demandas locais relativas a habitação, saneamento, mobilidade e infraestrutura.

Todas as informações obtidas nesses encontros serão sistematizadas e constituirão importante subsídio para a proposição de ações do poder público de Niquelândia no curto, médio e longo prazos.

Prefeitura conclui revisão do Plano Diretor

A Prefeitura Municipal de Niquelândia concluiu em novembro de 2019 a revisão do atual Plano Diretor (PD). Instrumento legal que estabelece as diretrizes para a ocupação física e territorial do município, o PD é uma exigência da Constituição Federal e do Estatuto da Cidade. É também uma forma de preparar o município para o surgimento de novas demandas de infraestrutura urbana e rural.

Plano Diretor 2019

A revisão do Plano Diretor cumpriu exatamente as etapas recomendadas pelo Estatuto da Cidade, que incluíram diagnóstico da situação, proposição de estratégias de ação, formatação de projetos de lei visando à exequibilidade das ações e leituras técnica e comunitária, sempre com a participação da população local (ou seus representantes eleitos) e das equipes técnicas da Prefeitura de Niquelândia.

“Fizemos a capacitação do Núcleo Gestor do processo de revisão do Plano Diretor e estabelecemos um calendário de reuniões com a população, principalmente de aglomerados urbanos localizados na zona rural, considerados prioritários. O processo culminou com uma audiência pública em outubro de 2019 para apresentação e discussão do Plano Diretor revisado”, explica o professor e arquiteto Mauro Ferreira, coordenador técnico da Interação Urbana.

Durante todo o período de debate e submissão de propostas, um website específico (http://www.interacaourbana.com.br/hotsite/Niquelândia/) registrou a programação das atividades e disponibilizou os documentos gerados no processo. O diagnóstico da situação socioeconômica e territorial do município de Niquelândia contemplou a formulação de ações de caráter normativo, por meio de projetos de lei, e de medidas de incentivo ao aperfeiçoamento de atividades econômicas importantes à população local, orientando o desenvolvimento sustentável do município.

Propostas

No perímetro urbano, além de definir o zoneamento de uso e ocupação do solo e ampliar os mecanismos de fiscalização das edificações particulares, o Plano Diretor 2019 propôs a consolidação de um órgão técnico permanente de planejamento em urbanismo. Modernos instrumentos urbanísticos de controle, como o Estudo de Impacto de Vizinhança, zonas especiais para aplicação dos instrumentos de urbanização também foram propostos na legislação, bem como se destacam as zonas de aproveitamento turístico da região do lago da Usina Hidrelétrica de Serra da Mesa.

É na área urbana que está a maior demanda por habitação, com perspectiva de um déficit de 1.045 unidades, aproximadamente, até 2029. Isso sem contar a necessidade de melhoria das habitações existentes. Diante disso, o PD interpôs mecanismos legais para a atualização da Planta Genérica de Valores e do Cadastro Físico Municipal, a criação de Zonas Especiais de Interesse Social, para regularização fundiária e construção de novas unidades habitacionais, e a constituição de consórcios imobiliários. O PD estimou em 51 hectares a área a ser urbanizada nos próximos dez anos e incluiu, entre as melhorias ambientais, a criação de parques lineares ao longo do rio Bacalhau, que corta a cidade, já que o município não possui ainda 12 m2 de área verde por habitante, como recomendado pela ONU.

A zona rural de Niquelândia também foi objeto do plano, uma vez que ela sofre com dificuldades de acesso a serviços públicos, transporte, precariedade habitacional e de saneamento. Entre os projetos previstos são prioridades a urbanização dos povoados de Quebra Linha, Vila Taveira, Indaianópolis, Muquém, Buriti Alto e Tupiraçaba, além do estabelecimento de programa de conservação das estradas rurais para promover atendimento à população rural dispersa pelas comunidades.

Tais medidas, aliadas a programas especiais de incentivo a atividades econômicas e suas cadeias produtivas e de industrialização, devem contribuir para melhorar os indicadores socioeconômicos da zona rural. Nesse sentido, o PD avança, apresentando diversas ações para apoiar a agricultura, elevar os patamares de produtividade, aumentar a produção e a renda e fortalecer os arranjos institucionais locais.

A necessidade de organizar o sistema de mobilidade também é reconhecida em Niquelândia e uma série de projetos busca aumentar a qualidade das vias e a segurança no trânsito. É o caso da proposta de classificação e hierarquização das vias segundo suas características físicas e as funções que desempenham na circulação local; a reestruturação do sistema viário básico acoplado à conclusão de um anel viário urbano; a qualificação das calçadas e acessibilidade. A segurança viária deve contar com ações prioritárias e intervenções necessárias para reduzir os acidentes, como obras de calçadas acessíveis e sinalização.

Por fim, a área de saneamento também é contemplada com destaque no PD, que propõe a oferta de água tratada a 100% da população urbana do município e a ampliação do sistema de coleta e tratamento de esgoto para beneficiar, até 2029, os mesmos 100% de pessoas. Ainda nessa esfera, são objetivos do Plano Diretor: coletar e destinar corretamente 100% dos resíduos gerados na zona urbana e dotar todas as novas vias urbanas de sistema de drenagem.